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quarta-feira, 26 de maio de 2021

 TEXTO DE MEMÓRIAS LITERÁRIAS

“EU ERA FELIZ E NÃO SABIA”
Prof Antônio José
Década de 70, nascia uma criança alva, de olhos castanhos, filho de um pescador respeitado e de uma mulher guerreira. Meu pai partiu nessa época, lembro do funeral como se fosse hoje, mas esse é um capítulo que quero pular. Quero aqui lembrar daquilo que me dá esperança, alegria, entusiasmo... Sempre morei em Icapuí e aqui desbravo a minha infância.
As lembranças são muitas, mas algumas têm um sabor especial. A minha infância foi recheada de brincadeiras, cavalinho feito de talo de carnaubeira e lá ia eu para o cercado pegar a matéria prima para fazer o meu cavalo e depois sair galopando sob as sombras dos coqueiros, driblando os carrapichos espalhados sobre a terra. Ah, como era bom ser criança naquela época! As roladeiras feitas de latas de Ninho, uma pegada na outra, como um trem com seus inúmeros vagões. E os cata-ventos de lata de óleo Pajeú? Como giravam pendurados no telhado da minha casa! Ficava horas no morro brincando de pipa, brinquedo que eu mesmo fazia. Muitas vezes, de tanto puxar a danada, a linha quebrava e ela só não se esparramava no chão, porque as palhas dos coqueiros não deixavam que isso acontecesse. A natureza tem seus mistérios!
Lembro-me, como se fosse hoje, dos rachas que fazíamos, outras crianças estavam comigo, na praia, com uma bola branquinha, a dente de leite, que nossos pais compravam depois de muito aperreio. Os cavaletes eram nossos fiéis amigos, com eles subíamos a serra, sempre debaixo do braço, e lá no alto sentávamos em suas cavas e descíamos embalados de serra abaixo. Cada um querendo chegar primeiro e aquele que alcançava a façanha fazia uma festa, também não era para menos. A gente realmente brincava!
Era um garoto travesso, lembro que cortava os caules dos coqueiros, só para fazer raiva aos seus donos. Saía com uma baladeira, depois fiquei sabendo que era chamada de estilingue, as rolinhas não tinham sossego. Quantas vezes não peguei aquelas pedrinhas brancas, arredondadas, encontradas na praia e atirei nas redes armadas, nos alpendres das casas, dizendo: “toma na cocada Zé Miolo”. Ludibriava meus pais, meus avós, escondia-me por trás dos morros quando saiam a me procurar na praia, no mar, nas pedras. Eu era travesso e não sabia!
O mar era e ainda hoje é o meu grande encanto, mergulhava em suas águas frias, às vezes geladas, deslizava sobre um pedaço de tábua nas suas ondas espumantes, ali estava a minha prancha, saía com uma catraia, isto é, um barco feito de isopor, ripas e, muitas vezes, coberto com talos de coqueiro. Com ele, eu ganhava o oceano e parava nas pedras para pescar de linha de vara, linha de mão e quando o peixe pinicava a isca, quase sempre era búzio coletado na praia, eu puxava a linha e comemorava o resultado da pescaria. Eu vibrava de felicidade!
Aquele tempo era muito diferente de hoje. Nós, crianças, realmente brincávamos, éramos felizes, apesar da vida difícil que levávamos. Os nossos brinquedos, em sua maioria, eram construídos por nós, a partir de objetos encontrados ou reaproveitados. A imaginação corria solta, não tínhamos que manipular algo pronto e acabado, tudo era muito natural. A vida era cheia de encantos e ficava mais misteriosa quando a minha avó me contava as histórias de trancoso. Existia tempo para as histórias, os romances, a literatura de cordel, as cantorias de viola, talvez seja daí que tenha nascido a minha admiração pela poesia popular.
Hoje, é todo mundo com um celular na mão, desde a mais tenra idade. Já não existem mais os ciclos de família, as rodas dos batelões, dos anéis, da pera, uva, maçã, salada mista. Não sobra mais tempo, os valores são outros, a vida deixou de ser humana para ser tecnológica. Ah, que saudade do meu tempo de criança! Eu era feliz e não sabia...
Pode ser uma imagem de 1 pessoa, criança, ao ar livre e texto
Hélio Fernandes Rebouças, Neide Alcantara e 1 outra pessoa
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